terça-feira, 20 de julho de 2010

Esquecemos o que entristece...



Cerca del Rio Ter



Esquecemos o que entristece
Olhemos ao lado bom da vida
Nascer-do-sol, quando amanhece
O pôr-so-sol, a despedida.
Mas se não tens ninguém ainda,
em silêncio fala com Deus,
porque as palavras mais lindas
são as que vêm do céu.
E tu que te sentes sózinha,
maldizendo a vida, chorando,
vem comigo por este caminho
em que nós vamos andando
se um dia na tua vida erraste,
e agora te sentes culpada,
lembra-te de quanto amaste
e de quanto foste amada.
E podes sentir-te tão sózinha,
sem um único ponto certo.
Mas há uma luz no caminho,
há sempre um sorriso aberto.

Danny Nogueira
Toronto Canada


quinta-feira, 15 de julho de 2010

Lembras-te...




Lembras-te de quando nos conhecemos?

Quando por primeira vez nos olhámos?

“Vamos ser amigos”, dissemos

E sem querer nos apaixonámos.

(Autor desconhecido)


Meu querido,

No dia em que nos encontramos por segunda vez, estava chovendo, lembras-te? Chegámos à porta do cinema e vimo-nos todos molhados, eu fiquei um pouco nervosa porque me havia arranjado com tanto cuidado para um encontro à porta do cinema e ali estava eu esperando aquele amigo que conhecia há pouco tempo e que a minha amiga Maria me tinha apresentado há uns dias numa discoteca. Tínhamos combinado um dia ir sairmos juntos.

Lembro-me que olhei para ti, tu sorrias e eu não te reconheci porque alguma coisa em ti estava diferente. Chamaste-me pelo meu nome…” Flor?” De seguida me dei conta que eras tu e que tinhas rapado o bigode. Rimo-nos tanto que até nos esquecemos da hora. Quando olhámos para o relógio já era tarde e deixámos o cinema para outro dia.

Fomos jantar e falámos tanto e sobre tantos assuntos que quase fomos convidados a sair do restaurante porque já tinha passado da hora de fechar. O clube onde combinámos ir dançar ficava muito perto e fomos caminhando e conversando.

Tinha terminado de chover!

O salão de baile estava cheio mas a nossa mesa estava ali…só para nós, tu tinha-la reservado no dia anterior. Lembras-te da primeira música que bailámos? “Besame, besame mucho” e eu comecei a sentir-me com a cara um poço vermelha, porque deixámos que a música nos levasse e comecei a sentir algo por ti o que nunca tinha sentido por ninguém.

Hoje passados tantos anos ainda penso que esse dia quem sabe foi o primeiro dia mais feliz de alguns que passei contigo.

Os anos passaram e ontem quando nos voltámos a encontrar no hospital tudo isto me veio à memória. Agora que te vou visitar estou escrevendo-te esta carta para que a lê-as e me digas se ainda recordas esses tempos da nossa juventude. Quero dizer-te que apesar de tudo o que passou, tu foste viver para a Argentina, eu fiquei em Portugal, tu casaste lá, eu fiquei solteira, dediquei-me à minha profissão de enfermeira, eu ainda me sinto enamorada de ti, nunca te esqueci e seguirei admirando-te sempre.

Segues sendo um homem excepcional!

Desejo que te melhores rápido!


Um beijo da tua amiga,

Flor

(29 de Outubro de 2009)


quinta-feira, 8 de julho de 2010

Bebido o luar...






Bebido o luar, ébrios de horizontes,
Julgamos que viver era abraçar
O rumor dos pinhais, o azul dos montes
E todos os jardins verdes do mar.

Mas solitários somos e passamos,
Não são nossos os frutos nem as flores,
O céu e o mar apagam-se exteriores
E tornam-se os fantasmas que sonhamos.

Por que jardins que nós não colheremos,
Límpidos nas auroras a nascer,
Por que o céu e o mar se não seremos
Nunca os deuses capazes de os viver.

Sophia de Melo Breyner Andresen

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Um novo encontro...




Ainda me dá vontade de rir ao pensar quando nos conhecemos. Não sei se ainda te lembras. Fez tanto calor de noite que resolvi dormir algumas horas na varanda. Fui buscar o colchão e coloquei-o no chão. O vento estava muito fraco diria mesmo que passava só uma ligeira brisa que fazia ondular a cortina que eu tinha colocado ali para tornar o espaço mais intimo.

Nunca tinha estado em Sevilha. Já me tinham dito que fazia muito calor e de vez em quando passava uma vista de olhos pela meteorologia pela net, mas como estava tão longe de viajar, até esqueci um pouco.
Quando acordei dei-me conta da pouca roupa que tinha vestida pois com o calor que fez durante a noite, devo tê-la ir tirando pouco a pouco. Bem, sobre a vizinhança não posso dizer nada, pois as poucas horas que consegui dormir foram de sono pesadíssimo e já pela madrugada.

Quando acordei já o sol estava tocando a minha cara. Levantei-me de seguida para poder manter o corpo fresco porque pelos vistos avizinhava-se mais um dia de calor.
Afastei um pouco a cortina, olhei para o prédio em frente e vi um homem a olhar na minha direcção a fazer-me sinais e percebi que queria falar comigo. Recuei e tapei-me mais um pouco com a cortina porque não há dúvida que não estava propriamente em condições para falar com ninguém naquele momento.
Comecei a pensar se ele me teria visto a dormir ali porque na verdade a varanda onde ele estava ficava mais alta que a minha. Vim a saber o que ele tinha visto umas horas mais tarde.

Antes de mais nada fui tomar um duche, por sinal a água saía quente tal era o calor que já se fazia sentir àquela hora da manhã. Escolhi uma roupa muito mais ligeira que a que tinha vestido no dia anterior. Arranjei um pouco a sala e saí para tomar um café e comprar um jornal.

Quando cheguei à rua lembrei-me se aquele "mirone" não estaria por ali, mas não, só umas crianças estavam brincando e pouco mais. Eram 08.30 h !
Sentei-me numa esplanada, já tinha comprado um jornal e uma revista num quiosque ali ao lado, pedi um café duplo e comecei a ler as notícias. Havia um sossego, uma paz, só se ouviam algumas andorinhas chilreando numa laranjeira florida ali perto. Que aroma a flores de laranjeira, flores de "azahar", como dizem os espanhóis.

Estava a pensar com os “meus botões” e senti que alguém se aproximava. Comecei primeiro a dirigir os meus olhos de baixo para cima, bem devagar, não estava com vontade nenhuma de conversas ou ter de aturar alguém vendendo alguma coisa. Quando levanto os olhos vejo-te a sorrir para mim e reconheci de seguida o meu vizinho da frente. Eras tu!

O que acabo de me lembrar não sei se alguma vez te contei. Do que veio a seguir, não vou falar sobre isso agora. São recordações de uns dias muito felizes, de tanta cumplicidade, como se nos tivéssemos conhecido há já muito tempo...
Nunca mais nos encontrámos pessoalmente, o telefone e a net foi o nosso elo de ligação, já lá vão uns meses...

Regressei esta manhã ao mesmo sítio à mesma hora, estou na mesma esplanada. Ainda falta um quarto de hora para o nosso reencontro… 
Sinto que o tempo esfriou um pouco.

Autor: Maria Isabel Q. (Flor)



sexta-feira, 18 de junho de 2010

Intimidade




No coração da mina mais secreta,
No interior do fruto mais distante,
Na vibração da nota mais discreta,
No búzio mais convolto e ressoante,

Na camada mais densa da pintura,
Na veia que no corpo mais nos sonde,
Na palavra que diga mais brandura,
Na raiz que mais desce, mais esconde,

No silêncio mais fundo desta pausa,
Em que a vida se fez perenidade,
Procuro a tua mão, decifro a causa
De querer e não crer, final, intimidade.

José Saramago, in "Os Poemas Possíveis"
(1923-2010)


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